Wes Anderson é um cineasta já consagrado por seu estilo visual único. O cuidado com o design de produção, a simetria e composição dos seus enquadramentos, a paleta de cores cuidadosamente pensada para cada cena, etc. Somasse a isso elencos repletos de estrelas e uma narrativa que sempre flerta com o absurdo em algum nível. Tudo isso pode ser encontrado em O Esquema Fenício, novo filme do diretor, que também escreve o roteiro ao lado do seu frequente colaborador Roman Coppola.
A trama acompanha o magnata Zsa-zsa Korda (Benicio Del Toro), que sofre mais um acidente aéreo, provavelmente vítima de um atentado, mas logo se recupera. Ao voltar para casa, ele decide nomear sua filha (Mia Threapleton), uma freira, como única herdeira de sua fortuna. Os dois então embarcam na consolidação de um novo empreendimento, que se torna alvo de espionagem industrial, intrigas, ataques terroristas e assassinos.
Contando com O Esquema Fenício, desde 2021, Anderson lançou 3 filmes e 4 curtas metragens na Netflix, e entres os projetos há ainda mais uma repetição de elenco e na formatação dos filmes. Diante disso há uma impressão de esgotamento do tipo de cinema proposto pelo diretor por talvez grande parte do público. E é obviamente uma opinião válida, que eu ainda não estou propenso a endossar.
Nos é apresentada uma trama um tanto cabeçuda que tem no seu cerne viagens e encontros para fazer o empreendimento milionário de Korda sair do papel, e curiosamente isso é o menos interessante do longa. É a antítese do que se espera de um filme onde temos espionagem, atentados, sabotagem, traições e drama familiar, justamente porque o diretor faz tudo parecer meio lúdico e teatral. Algo que já é convencional em seus filmes, novamente.
Mesmo com vários personagens, desta vez Anderson dá um enfoque bem definido para o personagem de Del Toro, que é uma pessoal de moral completamente questionável, e o contraponto com sua filha com quem quase não tem contato é o que torna tudo realmente interessante. É possível até traçar um paralelo com o própria carreira do diretor. Korda repetidas vezes sofre atentados e mesmo assim continua fazendo as coisas da sua própria maneira, e sempre repete “eu particularmente me sinto muito seguro”.
A essa altura do campeonato, Anderson não irá mudar seu jeito de fazer seus filmes, ele aposta sim no seguro, na sua zona de conforto, justamente porque ele é muito bom nisso. É possível enjoar do seu prato favorito? Sim, e cada um sabe o seu limite, mas eu prefiro Wes Anderson no seu dia menos inspirado, do que a maioria dos diretores atuais em seu auge.
Outro ponto de destaque é a presença de Michael Cera como o tutor Bjorn, ele também tem um tipo de atuação muito peculiar, e já foi acusado de sempre fazer o mesmo papel em seus filmes, logo a junção dele com Anderson é algo que simplesmente funciona, e até demorou para acontecer. Os dois tem o mesmo tom de humor meio letárgico, e sem entrar muto em spoillers, há uma mudança no direcionamento do seu personagem que me lembrou muito sua atuação em Rebelde com Causa (2009), um dos pontos altos da sua carreira em termo de atuação. Mia Threapleton em seu primeiro papel de grande destaque se encaixa perfeitamente nesse estilo, e não deixa a desejar no meio de outros astros tão experientes.
Há momentos em que o personagem de Del Toro passa pelas experiências de quase morte, onde temos passagens alegóricas do céu e julgamento da atitudes condenáveis dele. Tudo é milimétricamente pensado, como sempre, mas em preto e branco, dando alguns momentos de respiro ao filme. Aqui temos a breve participação de Willem Dafoe e Bill Murray como Deus, o que também faz muito sentido. Há quem diga que o elenco super estrelado é simplesmente desperdiçado em pequenas participações, mas que culpa ele tem se atores desse calibre querem e gostam de trabalhar com ele, mesmo em papéis menores? O ganhador do Oscar Oppenheimer também tem vários ótimo atores que quase nem tem fala no filme, mas lá isso aparentemente era uma virtude, e não problema.
O filme muitas vezes anuncia de forma acentuada seus futuros encontros e acontecimentos, o que pode ser encarado como uma quebra de expectativa em comparação com filmes normais de espionagem. Há algumas repetições de jargões e piadas que as vezes também passam do ponto, faltou dosar a mão.
Em resumo, O Esquema Fenício não é o melhor que Anderson já apresentou em sua filmografia, mas também não acho que seja o pior. Há tudo que o diretor sabe fazer de melhor, numa trama que é mais interessante quando se volta para o lado pessoal e suas interações do que do grande esquema em questão, o final incluvise mostra justamente isso.
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