O cineasta Bong Joon-ho fez história no Oscar 2020 quando o filme Parasita levou as principais estatuetas da noite e se tornou o primeiro filme em língua não inglesa a ganhar o prêmio de Melhor Filme. Seu primeiro projeto após esse sucesso é Mickey 17, uma escolha bastante peculiar, mas que tem a cara do diretor sul-coreano.
Baseado no romance Mickey 7, de Edward Ashton, a trama acompanha Mickey Barnes (Robert Pattinson), um “dispensável”, que é um funcionário descartável em uma expedição humana enviada para colonizar o mundo gelado de Niflheim. Quando ele morre em serviço, um novo corpo é criado com suas memórias.
Mickey é utilizado para diversos fins, desde testes de vacinas em laboratório ou exploração de lugares inóspitos no novo planeta. O filme abre com ele em uma situação de vida ou morte, e acompanhamos alguns flashbacks para entender como ele chegou naquela situação até a trama evoluir.
Temos aqui temas que o cineasta adora tratar em seus filmes, como as diferenças de classe social, relações laborais exploratórias e de alguma forma um pouquinho do que ele tratou também em Okja (2027), na relação humanos versus natureza.
Em alguns pontos podemos colocar Mickey 17 como uma mistura inusitada dos filmes do Hayao Miyazaki com Star Wars, mas com um viés muito mais cínico, ácido e reflexivo. O Mickey em si é uma pessoa meio estúpida, e não um grande herói destemido munido de coragem e coração puro, e mesmo assim ele acaba no centro dessa história que diz muito sobre nossas relações interpessoais e com a sociedade ao nosso redor.
A algum tempo Robert Pattinson parece escolher seus papéis pela estranheza e por como ele pode se entregar por completo a isso. Não que isso seja necessário, pois o estigma de vampiro teen galã já passou, mas ainda assim é ótimo velo se desafiar e buscar papéis diferentes como esse. Temos 2 Mickeys na maior parte do tempo, o 17, mais ingênuo e passivo e o 18, agressivo e impulsivo. Pattinson consegue dar o tom ideal para cada um deles, as vezes sendo até exagerado e esquisito, mas que casa muito bem com o que o filme pede.
O fato dele ser confrontado com essa outra personalidade sua, sendo teoricamente a mesma pessoa abre a discussão ética sobre o que nos faz um individuo completo, ou sobre vidas criadas artificialmente, mas esse não é o ponto central do longa.
Outra boa atuação é de Mark Ruffalo, que faz uma caricatura cafoníssima de tantos magnatas e milionários e reivindicam o título de inovadores da tecnologia para o bem do povo, mas que no fundo só querem encher o bolso de dinheiro.
Mickey 17 é uma viagem entre gêneros, já habitual do diretor, que tem muita sorte e coragem de poder disfrutar de um orçamento tão grande para fazer esse tipo de filme em Hollywood. É muito difícil imaginar diretores como Christopher Nolan ou Denis Villeneuve, sendo tão diretos e enfáticos num discurso anticapitalistas. Que as portas continuem abertas para Bong Joon-ho, pois ele é muito bem vindo.
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