“O peso do pássaro morto” – ou apenas Pássaro, como Aline se refere – foi publicado em 2017, pela editora Nós. O romance é composto de 168 páginas e um sentimento de querer mais. Acompanhamos a vida da narradora em diferentes fases de sua vida, olhando para os acontecimentos como quando sentamos em uma poltrona no cinema, e apreciamos cada movimento do protagonista. Se a personagem, que não tem nome, sofre, então sofremos junto a ela. Cada passo dEla é também um do leitor, impossibilitado de estar menos imerso na leitura: a escrita flui de tal forma, que nos tornamos parte das linhas escritas.
A visão da personagem é, sobretudo, poética. Em qualquer que seja a situação, seu lado melancólico se mostra presente de maneira que nos faz suspirar alto; soltar um “eu não acredito que isso aconteceu”. Suas falas são carregadas de metáforas muito bem construídas, que fogem do clichê. Um exemplo, dos meus favoritos dessa figura de linguagem: “Chorei pensando que chorar assim deve desmanchar o rosto da gente, derreter os cílios.”. A estrutura de seu texto também está completamente fora do padrão; as linhas não são sempre completas, há quebra no meio de frases, de forma que mescla a poesia e a prosa, muitas vezes formando imagens (quase como uma poesia concreta).
Com os altos e baixos, as perdas refletem nos demais anos de sua vida. Uma infância com um quê de sofrimento antecipado, adolescência conturbada e que antecipa a fase adulta, essa que só a faz ter certeza de que deveria ter saído para comer Pizza com seus pais, aos 17 anos – e isso é algo que só irá entender ao ler o livro. Quer ser aeromoça, rever Carla, dar-se bem com seu filho. O que não planeja, na verdade, é o que lhe traz felicidade: ter um cão como companhia, o grande Vento. Vento é um sopro de felicidade.
Por fim, indico a leitura do Pássaro, porque são tempos que a melancolia, a reflexão dos fatos, está sendo substituída pelo ódio generalizado. Essa leitura é um treino em entender o lado de alguém que passou por situações complexas, entender como as perdas corrompem uma pessoa – e assim, quem sabe, atentar-se aos que estão ao nosso lado. Não sei se a intenção de Aline foi criar um livro com tamanha necessidade de observação coletiva, mas me causou esse efeito acolhedor para com o outro. Sem sombra de dúvida, um dos favoritos desse ano, um favorito para carregar comigo durante a vida. Depois de concluir a leitura, precisei de um seu Luís, um benzedor, para acalmar meu coração.
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