“Pileques”, aquilo que faz referência ao excesso de bebidas, é um compilado de curtos textos e escritos diários de F. Scott Fitzgerald. Se há o conhecimento acerca do autor, é rápida a ligação entre o nome da obra e os vícios a que se submeteu em meio a exuberante Era do Jazz. Se pedissem para descrever o autor em três palavras, provavelmente seriam: jazz, Zelda e bebidas – os três amores que passaram a se mostrar como devaneios, levando-o a loucura antes mesmo de se dar conta. Logo ao início do livro, temos algumas frases e anotações de Scott, provavelmente observações que anotara ao decorrer de seus romances, ou ideias soltas em seu diário.
A segunda parte, particularmente minha favorita, tem o nome “o colapso nervoso”. As palavras aqui escritas são de 1936, quatro anos antes de sua morte repentina. Zelda, sua esposa, estava internada fazia um tempo, já que sofria de crises agudas de esquizofrenia; a saúde da mulher foi um dos principais fatores que transformariam o eu de Scott Fitzgerald. Após a grande depressão de 1929, o jazz perdeu-se junto com a vontade de viver de muitos da época – antes da crise de superprodução, tinham hábito de festas ilustres a qualquer dia da semana. Por que festejariam agora, se todos estavam empobrecidos de alma e de finanças?
É nesse capítulo que Scott alega que não mudaria de ofício de forma alguma, mas, de qualquer maneira “poria de lado quaisquer tentativas de ser uma pessoa – ser amável, justo ou generoso […] Não haveria mais doação de mim mesmo – daí em diante, toda doação deveria ser proibida e ganharia um novo nome, e esse nome era Desperdício.”
A terceira parte é constituída de fragmentos de seus diários ao decorrer de doze anos. Ali temos registros dos hotéis em que Zelda e ele passaram as melhores e piores noites da vida de ambos, desde o nascimento de sua filha até a ideia de que finalmente tinha dinheiro suficiente para esbanjar como aqueles americanos meritocratas.
“Dormindo e acordando”, a quarta parte, por sua vez, retrata o momento que a insonia pega o autor para ser companheiro ainda mais presente que sua própria esposa. Assim como “Minha cidade perdida”, o penúltimo capítulo, temos contato com textos curtos, mas sempre repletos do sentimento moribundo de Fitzgerald diante a sua exaustiva vivência. Para encerrar de forma ainda mais íntima, a última parte é uma breve seleção de cartas do autor para amigos ou outros escritores – independente de quem fosse o destinatário, muitas vezes estava bêbado a ponto de tampouco saber o que estava escrevendo.
Lendo esse livro, especialmente “Colapso nervoso”, me lembrei de uma frase que Hemingway usou para descrever Scott em “Paris é uma festa”: “Seu talento era tão espontâneo como o desenho que o pó faz nas asas de uma borboleta. Houve uma época em que ele tinha tanta consciência disso quanto a borboleta, não ligando para o fato de que seu talento podia apagar-se ou desaparecer de todo. Mais tarde começou a preocupar-se com as asas feridas e sua estrutura. Aprendeu a refletir, mas já não conseguia voar porque o amor ao voo o abandonara. Restava-lhe apenas a lembrança dos dias em que voar fora um ato natural.”
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